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As marcas do meu tempo

Desalento.

Com este sentimento – próprio às canções de Taiguara – vão às urnas hoje os brasileiros da minha geração – sejamos generosos com o conceito antigo de geração, 20 anos; portanto entre 45 e 65, pouco mais, pouco menos.

Pelo noticiário que os jornais estampam, não é difícil entender o porquê. Nossos melhores sonhos de um Brasil representativo – à direita ou à esquerda – despencaram, um após outro, em vertiginosa seqüência de fracassos e decepções.

Perdemos o passo da História, e não conseguimos virar a página para chegarmos ao capítulo da justiça social e da dignidade.

É um triste legado que deixamos aos mais jovens – aliás, é perceptível a falta de expectativas e de bons projetos entre a garotada.

II.

Como diria Gilberto Gil, numa de suas primeiras canções, Louvação, "eu tiro os outros por mim". Por isso, valho-me da minha trajetória como eleitor para dar premissas ao que digo.

Votei pela primeira vez para Presidente como a maioria dos brasileiros em 89. Acreditava em Mário Covas, e nele votei no primeiro turno. No segundo turno, descrente, anulei o voto. Ainda hoje não me convenci se fiz certo ou errado. Um amigo petista me dizia à época:

— Você ajudou Collor a se eleger.

Achei um certo exagero, próprio aos militantes do PT de então, senhores absolutos da verdade e da justiça. Mas, vamos em frente…

Em 94, não tive dúvidas em escolher o então ministro Fernando Henrique Cardoso. Era uma referência, diria, uspiniana, um intelectual de ‘esquerda’, sociólogo de renome internacional. Uma reserva moral que se transformou em grossa decepção. O Brasil que, sorridente, anunciava em seus pronunciamentos só existiu no espaço vazio dos seus pronunciamentos.

Em 98, fui de Lula. Ressabiado, mas fui. A compra dos votos para reeleição de FHC, as privatizações, o Brasil ao abandono. Era-me inevitável dar um passo à esquerda.

FHC venceu no primeiro turno, com uma boa força dos meios de comunicação.

Em 2002, estava convicto: a vez era de Lula e do PT.

Como vêem, não sou petista. Mas o Lulinha “paz e amor” me convenceu. Pareceu um caminho novo, comprometido com o social. A esperança venceu o medo.

III.

E assim chegamos a 2006. Chegamos na esteira de uma série de escândalos nunca dantes anunciados pela Mídia. Mas, para ser rigorosamente justo, também nunca dantes (gostei da palavra), jornais, revistas, emissoras de TV tiveram tanta gana em anunciar escândalos. Mas, vá lá, existem, estão aí. Precisam mesmo ser apurados e os responsáveis que arquem com as sanções devidas.

Enfim, poderia listar uma série de nomes aqui. De Lula a FHC. De Maluf a Brizola. De Collor a Sarney. De ACM a Miguel Arraes. Quércia, Zé Dirceu, entre outros. Todos desabrocharam e viraram flores do pântano…

Políticos que se dizem da nova geração, digamos, como Alckmim e Aécio, também não inspiram confiança porque representam um sistema político/partidário decadente que aí está há décadas e décadas. Que anuncia mudar tudo para nada mudar.

São, a meu ver, a perpetuação do que o jurista e escritor, Raymundo Faoro, um dia chamou de "os donos do Poder".

IV.

Valho-me para terminar de uma citação do pensador italiano Antônio Gramsci. Sejamos, pois, “céticos no pensamento e otimistas na ação”. É bem provável que, para a construção de uma Nação contemporânea e justa, seja mesmo indispensável vencer tais etapas, demolir mitos e construir a verdade de um Brasil de todos os brasileiros.

Nunca a frase me soou tão necessária e urgente – e olha que não foram poucas as vezes que a escrevi em forma de desejo e fé no amanhã.

V.

Um adendo.

Taiguara foi um cantor/compositor de sucesso na virada dos anos 70. Autor de uma canção-hino para época, chamada ‘Hoje’, que inspirou o título e o tom destas linhas malescritas.

Seus versos iniciais dizem:

"Hoje trago em meu corpo as marcas do meu tempo.
Meu desespero, a vida num momento.
A fossa, a fome, a flor, o fim do mundo…"

Taiguara foi perseguido pela Ditadura e se auto-exilou. Morreu em 14 de fevereiro de 1996.