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Ben Jor – A magia do alquimista dos sons

Nelson Motta costuma dizer que a música de Jorge Ben Jor tem clima de festa e universalidade. “Desde sua estréia, ele sintetizou em seu violão a bateria de uma escola de samba”, resume o jornalista. “É o único de nós que pode orgulhar-se de nunca ter feito uma música triste”, arremata Caetano Veloso, outro ardoroso fã do cantor/compositor de Rio Comprido, subúrbio da Zona Norte carioca. “Eu faço uma música urbana, suburbana e rural, com raízes africanas, brasileiras e universais – explica-se Jorge Duílio Lima de Menezes, um fagueiro cidadão do mundo que, aos 48 anos (não assumidos), mantém em evidência, um dos trabalhos mais criativos da chamada linha evolutiva da música popular brasileira.

Faz sentido. O Babulina (apelido que ganhou na adolescência) orgulha-se de muitas coisas. Fatos, personagens e paixões que invariavelmente vão habitar as letras de suas insinuantes canções. Orgulha-se do amor pelo futebol (só próximo aos 40 anos desistiu da idéia de ser jogador profissional), do seu Flamengo, da sua religiosidade (“Sou um cara meio espiritual, meio rosacruz, um alquimista musical”) da mulher e musa Domingas Tereza, dos filhos Tomazo (9 anos) e Gabriel (7 anos), da sua Banda do Zé Pretinho, e do contingente de amigos que literalmente o idolatram como a um grande mestre. Entre eles, Chico Buarque, Gilberto Gil (que, em 75, gravou um definitivo álbum duplo (Gil Jorge), Rita Lee, Lulu Santos, Titãs, Kid Abelha, Paralamas, entre outros.

Jorge Ben Jor está em São Paulo para o pré-lançamento do novo elepê Jorge Ben Jor Ao Vivo (faz hoje sua última apresentação no Palace). Na tarde de terça-feira, falou com exclusividade ao DCI/Shopping News. DCI/Shopping News

– Como é ser paparicado pelos principais nomes da MPB? Caetano repete que você é o maior poeta da música popular…

JBJ – É sempre gratificante. Me sinto orgulhoso, mas no bom sentido. Orgulhoso de fazer um trabalho que os meus caríssimos amigos gostam e aplaudem. Caetano, principalmente, que é um grande poeta. E mesmo agora a garotada dos Titãs, dos Paralamas, do Kid Abelha, a Sandra Sá, o Barão Vermelho. É uma coisa maravilhosa. Eles gostarem da minha música e reproduzirem em disco. Uma coisa que fiz há vinte e tantos anos, estão fazendo hoje e acham que é atual. DCI/SN –

— O Lulu Santos disse textualmente isso quando gravou Samba, Rock e Outras Levadas. Disse que pesquisou um punhado de sons e acabou chegando aonde você havia começado. Outro belíssimo elogio foi o do Gilberto Gil num dos programas Roda Viva. Alguém lhe perguntou se não fosse o Gil quem gostaria de ser. No ato, disse Jorge Ben Jor. Por quê? Porque ele é um cara feliz. Nesses tempos de crises, qual a receita dessa felicidade?

JBJ – Sou feliz por natureza. Não gosto de ver ninguém triste. Gosto de levantar o astral das pessoas. É lógico que a tristeza me comove. Minha música pode começar triste, tratar de uma temática triste. Mas tem sempre um final feliz. Uma pena que nem sempre todos entendam esses toques que são sempre positivos…

– Esse positivismo, digamos assim, de suas canções vem do lado esotérico? Você teve uma fase mística. Como foi isso?

JBJ – Minha fase mística foi basicamente nos discos Tábua de Esmeralda e Solta o Pavão. Isso foi no inicio dos anos 70 e agora estou vendo muita gente nessa trilha. Acho um barato o sucesso dos livros do Paulo Coelho. Agora tem que ter seriedade para falar dessas coisas. Quando falei dos alquimistas fiz um trabalho sério. Sou um cara ligado no espiritual, meio rosacruz, um alquimista musical. Meu avô me deixou muitos ensinamentos. Ele era muçulmano e rasacruz. Deixou muita sabedoria, deixou livros. São esses ensinamentos que, às vezes, sempre que posso, repasso em minhas letras. Aprendi com ele a bondade, a generosidade, a respeitar a verdade de cada um.

– Como foi sua iniciação nas ciências ocultas?

JBJ – Primeiro, li o livro dos alquimistas. Sempre gostei de ler sobre São Tomás de Aquino e Santo Alberto – O Grande. Foram santos que usaram a alquimia. São Tomás de Aquino foi aluno de Santo Alberto que o introduziu na arte hermética. Um dia, em Paris, acabei por conhecer os filósofos herméticos contemporâneos. Fui onde se reuniam e pedi permissão para fazer esses dois trabalhos. Fiz isto com consciência.

– Essa história de mudar de nome, apesar da justificativa de não lhe confundirem com George Benson no Exterior, também está ligado a essa coisa mística, espiritual. Benjor parece nome de uma entidade espírita de um alquimista…

JBJ – Ben Jor é um beduíno, um guerreiro nômade. Quando fui no I Festival da África na Argélia, travei conhecimento com este nome. Achei forte, achei bonita a semelhança com Jorge Ben. Os caras lá me chamavam de Jorge Ben Jor, depois só Ben Jor. Aí gostei porque é o nome de um grande guerreiro. E, quando estou no palco, sinto uma mística, uma energia que me passa uma coisa boa. É o que tento transferir para as pessoas. Me sinto um alquimista musical.

– Você começou fazendo bossa-nova…

JBJ – Quando comecei já não era bossa-nova. O pessoal lá do Beco das Garrafas fazia um movimento que a gente chamava de MPB, mas que tinha muita influência do jazz – como a bossa-nova, mas diferente. Mesmo para esse pessoal, eu já fazia um som diferente. Falavam que minha música possuía um esquema novo. Este slogan acabou virando nome do primeiro elepê Samba Esquema Novo.

– E esse som original hoje está no mundo todo. É verdade que você vende mais discos lá fora do que aqui, no Brasil?

JBJ – À época do lançamento do Benjor, em 89, tive a informação de que já havia vendido mais de 11 milhões de discos entre Europa, Estados Unidos e Japão. Lá, tenho onze discos lançados. Por aqui, os meus 22 elepês venderam algo em torno de 6 milhões de cópias. Mas, tudo bem. Quase todos os meus discos permanecem em catálogo. Não tenho do que me queixar. Acho que peguei uma geração boa, uma época boa, que, apesar da repressão, continua até hoje dando as cartas. Uma geração que veio, felizmente, para ficar. Hoje o cara faz sucesso por quinze minutos. Nossas músicas ficaram.

– Mas Que Nada, sem dúvida, seu maior sucesso, é um exemplo.

JBJ – É, foi uma coisa fenomenal. Ainda em 88, estive em Los Angeles, com Sérgio Mendes, que regravou Mas Que Nada, e ele me disse isso. Até o estouro da minha música, o americano jamais havia transformado em sucesso uma canção que não estivesse vertida para o inglês.

– Assim que estourou Mas Que Nada, nos Estados Unidos, você foi viver lá…

JBJ – É foi em 66. Ganhei uma bolsa para estudar música. E fui embora. Só que não agüentei. A saudade era muita. Um frio. Nunca tinha visto neve. Aí eu ligava para cá e os amigos diziam que aqui estava o maior verão, um sol, um calor, dando a maior praia. Não, agüentei. Peguei meu boné e vim embora.

– De volta ao Brasil, você foi participar do Fino da Bossa, com a Elis Regina na TV Record…

JBJ – Pois é. Mas, não durei muito. Fui expulso do programa porque havia me apresentado no Jovem Guarda. Os caras eram fogo! Tentei argumentar. Pô, mas o Roberto, o Erasmo sempre foram meus amigos. O programa é na mesma emissora. Eles me convidaram… Que nada! Não teve apelação. Tá expulso, disseram.

– Aí, logo em seguida surgiu o Tropicalismo.

JBJ – E lá fui eu. O Guilherme Araújo, que era empresário do Gil e do Caetano, me convidou. Ele disse: Estamos com um programa em mente, e queremos você. Foi o Divino Maravilhoso na TV Tupi. Aprendi muito nessa fase. Foi um casamento perfeito. Cada semana, davam um tema para gente fazer uma música. Foi assim que nasceu Olha a Banana, Que Maravilha, Barbarella. Foi uma pena que acabou…

– Charles Anjo 45 é sua música mais conhecida como crítica social, mas você teve problemas também com a censura por causa de Mano Caetano…

JBJ – Charles Anjo 45, mesmo País Tropical, Olha a Banana foram músicas que refletiam o Brasil daqueles anos. Aprendi com os baianos a driblar os censores da época. Só que, ao meu jeito, sempre dei um toque de esperança…
Olha a Banana, por exemplo, fala de um menino que precisa vender banana para viver. Mas, é um cara honesto, que não foge da luta e tem lá seus prazeres que é andar sempre na moda. E para o seu amor, ele gosta de contar as suas prosas. Agora, Mano Caetano deu problema. Porque os caras disseram que eu estava preparando a volta do Caetano. Ele estava no exílio. Falaram que minha música era subversiva…

– Há tempos que você não fazia uma temporada de shows em São Paulo. O show Jorge Ben Jorge Ao Vivo tem motivo especial, além do pré-lançamento do seu novo disco?

JBJ – Há uns dois anos e tanto que não venho em temporada para a cidade. Foi no lançamento do disco anterior (Benjor – 89). Estive no Aeroanta e no Damaxoc. O que está valendo mesmo, agora, é o pré-Iançamento do disco ao vivo que gravei para WEA. Gravei no final do ano passado no Jazzmania do Rio de Janeiro.

– Jorge, o pessoal está anunciando que este é o primeiro disco ao vivo que você grava. Mas, a sua antiga gravadora, a Polygram, em meados dos anos 70, lançou em disco, também ao vivo, um show que você fez no Olímpia de Paris.

JBJ – É, rapaz. É isso mesmo. Só que a diferença é que aquele disco foi até uma surpresa para mim. Eles gravaram um dos shows que fiz no Olímpia e acabaram por lançar em disco num ano que não gravei o elepê anual. O disco atual, Jorge Ben Jor Ao Vivo, é m ais diferenciado porque foi algo programado. Eu tinha essa intenção há alguns anos. Outra diferença é que esse disco vem com muitas músicas inéditas…

– Quer dizer, além daquela habitual reedição que você faz para antigos sucessos, as inéditas vêm com força total…

JBJ – É por ai. Tem a ‘W/Brasil’ que eu cantei num show que fiz aqui no Masp e que tem uma temática non-sense. Fala de coisas atuais…

– Faz uma “homenagem” ao presidente Collor, inclusive…

JBJ – Digamos que eu faça apenas uma indagação. A música fala de um Fernando que não sabe se vai participar do torneio de surfe ferroviário. Lembra que ‘do Planalto mandaram avisar que todo o dinheiro será devolvido quando setembro chegar’. Tomara! Tem também ‘Ela Mora na Pavuna’, que é uma menina que eu vi sambando num clube lá na Pavuna, no Rio de Janeiro. Tem o ‘Costa do Marfim’, que é uma música mais puxada para o afro. Tem ‘Menina Sarará’, ‘Remexendo’, ‘Miudinho’…

– Como é que é esse coisa de cantar para o filho…

JBJ – O maior barato. Fiz uma música para o Gabriel e outra para o Tomazo. Cada música vai no estilo que cada um dos garotos gosta. O Tomazo é mais chegado ao rock. Então, fiz um rockzinho pauleira, um heavy-metal. Já o Gabriel faz um gênero de mais cadência, mais suingue, então fiz um afoxé, que inclusive canto no show…

– Ben Jor, para terminar, é verdade que só aos 30 e tantos anos você desistiu da idéia de ser jogador de futebol?

JBJ – Não é bem assim. Sempre gostei de jogar futebol. Garoto ainda, cheguei a jogar no juvenil do Flamengo, ponta-direita. Gostava também de nadar e de jogar pólo aquático. Só que esses são dois esportes que se precisa ter pulmão para aguentar o tranco. Já no futebol dá para enganar. A gente faz uma pose, toca de lado, dá um tempo… É mais maneiro. Agora estou jogando no meio-de-campo, só orientando a garotada. Aliás, se o Falcão (técnico da seleção brasileira) precisar de jogador experiente para comandar a seleção, é só me convocar… Vou dar a maior força.