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Cassação. Ou quando a notícia é o espetáculo

"A gente sempre destrói aquilo que mais ama" (Oscar Wilde)

01. Não me entusiasma o jeitão festivo dos nossos meios de comunicação para anunciar a cassação do mandato do deputado Hildebrando Pascoal na tarde/noite de quarta-feira no Congresso Nacional. O parlamentar pelo Acre foi acusado de liderar organização criminosa para fins de narcotráfico internacional e homicídios. No plenário, a derrota inapelável por 394 votos a favor e 41 contra, com 25 abstenções e 7 votos em branco. Consta que os próprios deputados aplaudiram a decisão após a votação. Ou seja, rejubilaram-se por fazer cumprir o que determina a Lei, por estar em sintonia com a pressão popular que se estabeleceu a partir do momento em que as notícias ganharam espaços nobres; seja nas capas das revistas semanais, seja nos valiosos minutos dos nossos principais telejornais.

02. Na manhã seguinte, parlamentares posavam de heróis da Nação. As manchetes davam conta do grande feito e do papel preponderante que a Imprensa exerceu durante o dificil processo.

03. Fico um tanto perplexo com essas reações. Talvez em razão dos meus maus bofes, não entendo direito quando a regra vira exceção e o óbvio é saudado com fogos e fanfarras. Desconfio de todos que se arvoram paladinos da Justiça, daqueles que clamam pela Lei dos homens e dos deuses quando se vêem sob as luzes de uma transmissão em rede nacional de TV.

04. Ora, o cara é um gangster. Portanto, tem mesmo que ser cassado. Tem mais é que ser preso, julgado e condenado — e ponto. Transformar esse episódio num megaespetáculo, sob qualquer pretexto, é um grande equívoco. É passar para o povão a ideía de que agora tudo no País vai funcionar. Não haverá mais impunidade e, aí daquele que se houver mal, terá que enfrentar os implacáveis rigores da Lei.

05. Não se iluda, caro leitor. Há muita sujeira sob o tapete da sala de estar. E, acredite, essa limpeza — ampla e irrestrita — precisa ser feita com urgência. Não adianta imaginarmos que está tudo resolvido a partir dessa cassação. Não vale sequer como primeiro passo, serve para sinalizar que este País tem jeito e depende substancialmente da nossa consciência e cidadania.

06. Há tempos o brasileiro vem amargando revéses por não acreditar na capacidade de gerir o próprio destino. Espera por um príncipe-sociólogo, pelo vice-rei baiano, pela generosidade das elites, pelo FMI, pelo Estado, pela volta do Salvador da Pátria… Como um garotão que prefere não crescer e fica na dependência que papai e mamãe resolvam os problemas que ele mesmo tem que enfrentar sob pena de destruir os próprios sonhos. Ninguém vive por nós.