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Homens (e mulheres) de preto

Ocorre-me a suspeita de que há algo de errado no figurino dos telejornalistas (vá lá, vamos chamá-los assim) que vejo na cobertura dos recentes fatos políticos do país e mesmo em outras áreas.. Usam e abusam da cor preta nas vestimentas, o que dá um aspecto lúgubre às suas inserções. Como a nos dizer que estão de luto.

– E estão – alguém me diz.

E acrescenta: “posicionam-se, pelos tristes acontecimentos que testemunhamos no País, de algum tempo para cá”.

Eles também anteveem a iminência de uma ruptura do estado de direito, o fim da institucionalidade que aflora, a democracia em risco? – pergunto ao meu jovem interlocutor.

– Não, não, eles são contra a Dilma mesmo. Contra a Dilma, contra o Lula e a favor do impeachment.

II.

Fico perplexo – aliás, como não deveria, pois já passei dos 60 e trago um bom naco de tristezas e decepções no bojo do meu embornal.

– Mas é uma ordem do patrão, das chefias?

Outra pergunta que lhe faço, e me parece bem cabível.

Pela experiência que acumulo nessas praças, as redações, sei que não é rara a subserviência dos editores aos senhores da mídia, e estes aos próprios interesses. Nem sempre objetivam – tanto uns e outros – o bem comum e, minimamente, o bom jornalismo.

Desconfio que me enrosquei demais no enunciado complementar à pergunta porque meu interlocutor demora alguns segundos para responder:

– É, digamos que há de tudo um pouco. Os patrões estão fechados com o que você (eu) chama de Golpe, as chefias são simpáticas a quem as paga, mas, vou lhe dizer, a turma da redação está gostando do oba-oba. Alguns não estão nem aí, outros compram a versão do maioral, e poucos, poucos mesmo, se rebelaram.

III.

Esqueci de dizer, mas o faço agora: o meu interlocutor faz estágio no Jornalismo de uma de nossas emissoras de TV. Não sabe se quer ficar por lá quando terminar o curso. No entanto, aproveita a experiência para conhecer os bastidores da produção das notícias.

Para o futuro, pensa fazer uma pós fora do País – o que acho louvável – e, a partir daí, realizar-se como profissional de Imprensa que transita por todas as plataformas em uma carreira solo que lhe dê maior independência e lhe permita voos mais audaciosos.

Quer praticar um jornalismo que chama de autoral.

IV.

A figura parece ter vocação para coisa. Está no caminho certo, creio. Tanto que, malandramente, me dá o toque:

– A coisa toda de usar preto começou no Jornal Nacional, no dia em que o Lula tomou posse (ou quase) como ministro.

(Nas redes sociais, começou uma campanha para que todos se vestissem de preto em sinal de protesto etc etc)

– Então, a moça da bancada da JN veio com uma blusa preta e o William Bonner de gravata preta. A Globo fazendo, o pessoal das demais emissoras vai atrás, como sempre.

V.

Olaiá…

Agora, sim, fiquei preocupado, mas algo curioso.

E provoco:

– Quer dizer que, no dia em que anunciarem o impeachment (que me parece, infelizmente, questão de tempo) e se as redes sociais mandarem, os apresentadores do JN podem aparecer na telinha, com meneios e requebros de Carmem Miranda, e brejeiramente anunciar: “Uhuuh! Yes, nós temos impeachment”.

VI.

Meu interlocutor deixa escapar um sorriso amarelo. A sugerir que não fui lá muito elegante com tão nobres e ilustres figuras. Mas, não resisti.

Com um leve balançar de cabeça se despede, e sai com passo acelerado.

Não o agradei mesmo.

Não me deu sequer oportunidade de desculpar-me se o constrangi de alguma forma. Reconheço: foi uma tola vingancinha, de minha parte. Por tudo que tenho ouvido do casal.

Enfim…

VII.

Ocorre-me outra lembrança agora que estou só: as histórias que o pai e os amigos contavam sobre a crueldade dos “camicie nere” na Itália, de Mussolini. No linguajar da moçada de hoje, os ‘camisas pretas’ tocavam terror em quem resistisse ao fascismo.

Não, não tem nada a ver uma coisa com a outra.

Outra bobagem minha.

É pura coincidência.

Tomara…