Sign up with your email address to be the first to know about new products, VIP offers, blog features & more.

O templo, o personagem e eu

Não saltei na estação Saint-Michel.

Ia iniciar minha aventura.

Saltaria na próxima.

Passo a passo, metro a metro, exploraria a cidade estranha.

Tudo chegaria a seu tempo.

Inclusive o amanhã.

Quando cheguei lá fora, descobri que estava num cruzamento de várias ruas.

Escolhi a maior delas, a que parecia deserta.

(Com o frio, tudo estava fechado.)

Caminhei alguns metros.

Cem.

Duzentos.

De repente, vi a massa branca e estranha de uma igreja.

Já a conhecia de vista e do postal.

Era a Notre-Dame.

Havia lido o romance de Victor Hugo, numa edição condensada de livro de bolso.

Tinha visto o filme, numa noite vazia diante da tevê, com Anthony Quinn e Gina Lollobrigida nos papéis de Quasimodo e Esmeralda.

Meu irmão, que entendia do assunto, me garantiu que havia uma versão melhor e mais antiga, com Charles Laughton e Mauren O’Hara – mas, ele era um arqueólogo do cinema.

E eu, um enfastiado de tudo. De igrejas, filmes e romances.

Mesmo assim eu entrei no enorme templo.

Estranhei a escuridão.

Tudo me pareceu apertado e sombrio.

Aos poucos, a vista se acostumou e eu comecei a distinguir

as colunas,

a nave central muito comprida e alta,

os vitrais.

Parei bestificado diante de um deles,

a roseta azul.

Tive a sensação de já ter visto aquela combinação de cores.

Não sei onde…

Num caleidoscópio perdido na primeira infância, talvez.

O contraste das cores iluminadas…

O espaço vazio das colunas magras e compridas me imobilizou.

Honestamente.

Eu não sabia o que estava sentindo.

Mas era evidente que alguma coisa se abria dentro de mim…

II.

Divagações do jovem Alfredo, personagem do romance “O Irmão Que Tu Me Deste”, de Carlos Heitor Cony. Ediouro, 1979.

Reli o livro ainda na semana que passou.

De alguma forma, que não sei explicar, me identifiquei com o personagem. Foi um pouco (ou muito?) assim que me senti quando, pela primeira vez, visitei a basílica Notre-Dame de Paris.

1986.

Tanto tempo, não?

Não era tão jovem quanto Alfredo, eu já passara dos 30, mas ainda trazia em mim todos os sonhos do mundo.

Mesmo assim, foi impactante a sensação que me trouxe aquele espaço raro e, num primeiro momento, sombrio – o interior do templo, meus pensares… os dois?

Uma situação deu ensejo a outra, ou… sei lá…

Ainda hoje, vez ou outra, o tal estranhamento me vem à mente.

E eu nunca soube explicar.

Voltei lá algumas vezes. Naquela ocasião e em outras viagens que fiz a Paris.

É sempre um momento que me toca e seduz.

Mas, aquela primeiríssima impressão, meus caros, continua um enigma.

Ainda…

Foto: Wikimedia Commons

Ainda nenhum comentário.

O que você acha?

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *