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O amigo do amigo do pai

O amigo do amigo do pai chamava-se Felipo.

Ele era parente do Sr. Orlando, este sim amigão do peito e de farras do Velho Aldo.

Novo no bairro e no país, a italianada barulhenta do Bar Astória não perdoou: logo o apelidou de Dom Felipo.

Nas rodas dos finais de semana, quando a turma se reunia para o tradicional jogo de Patrão e Sotto, a versão que corria dizia que Dom Felipo chegara a pouco de Nápoles e alguns apostavam que logo logo o homem voltaria para a Velha Bota.

– Sto amando il Brasile, ele respondia em tom de protesto.

Os mais debochados – o pai, entre eles – provocavam que, se ficasse, seria por dois motivos: as tecelãs das fábricas de tecidos das imediações do Largo do Cambuci e o futebol brasileiro, esplendoroso naquele início dos anos 60.

Se verdadeira ou não a afeição peas lindas moças que subiam e desciam a rua Lavapés nas idas e vindas ao trabalho, não sei. Mas, dali das portas do Astória, tinha-se um belo posto de observação para eventuais olhares e flertes.

De outro modo, sempre soube que Dom Felipo era palmeirense por óbvios motivos. Porém, gostava mesmo era ver jogar o timaço do Santos de Pelé, Coutinho & Cia.

Podia lá ter feições e até o jeito de andar, mas bobo, bobo, Dom Felipo não era.

Lembro que numa tarde de sábado o Santos jogaria no Pacaembu não sei exatamente contra quem.

Eu devia ter uns 10, 11 anos, se tanto.

Fui com Dom Felipo ver o futebol. O pai autorizou.

Os garotos entravam de graça desde que acompanhado com um adulto responsável.

Não foi exatamente o nosso caso.

Explico o motivo.

Dom Felipo havia comprado ingresso mais barato, para arquibancada normal. Ameaçava chover, e o tal resolveu invadir – isso mesmo, invadir – as numeradas cobertas do Pacaembu.

Por causa do bambino aqui.

Pode?

Na verdade, não éramos os únicos.

Havia um tumulto junto ao gradil. Uns 20 ou 30 torcedores forçavam o portão de entrada junto às pontudas lanças de ferro que separavam as duas alas.

Alguns, mais ágeis, conseguiram pular a cerca – e logo se escafederam entre as cadeiras ainda vagas.

Dom Felipo resolveu fazer o mesmo. Antes, porém, me alçou sobre os ombros e pediu para outros torcedores que me apanhassem do outro lado.

Saco de batata, manjam?

Foi como me senti.

Em seguida, saltou também.

Assisti à partida de olho nos policiais que em seguida chegaram e dispersaram os invasores retardatários.

Minha humilde e atarantada conclusão: o italiano já estava devidamente aculturado às mazelas desses trópicos.

Desde então passei a olhar com desconfiança – e à distância –  o amigo do amigo do pai. Que mais tarde, eu soube, voltou para a querida  Itália, de braços dados com uma viçosa brasileira – não sei se exatamente uma tecelã.

II.

Vi no telejornal da TV que há um ‘amigo do amigo do pai’ solto na praça.

O homem é poderoso.

Mandou censurar uma revista, tirar um site do ar e está à procura de quem falou coisinhas dele por aí.

Nunca soube que Dom Felipo tenha voltado ao Brasil.

Será?

De qualquer forma, esclareço logo que nada tenho a ver com essas escaramuças.

Juro, e meus amáveis cinco ou seis leitores estão de prova, é a primeira vez que conto essa história.

Nem pro pai, eu contei à época.

O Aldão era homem sério, de responsa.

III.

Mudo de assunto.

Olhem que legal!

 

 

1 Response
  • VERONICA PATRICIA ARAVENA CORTES
    18, abril, 2019

    Pulando o alambrado, hein!

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