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O Largo do Cambuci, o voto e o slogan

"Nunca ande por caminhos já traçados, pois eles conduzem até onde os outros já foram" (Alexander Graham Bell)

01. Doutor, doutor… esse aqui é meu filho. A figura grandalhona, sorridente, de extrema empatia popular, apertou cuidadosamente minha mão. Não estava entendendo muita coisa do que acontecia ao meu redor. Mas, meu pai — lembro-me — estava super feliz, eufórico mesmo. Enquanto o Chevrolet preto, pesadão, se afastava levando o ilustre doutor Adhemar de Barros, ele anunciava para todos que o futuro presidente havia cumprimentado o garoto…

02. Devia ter uns seis pra sete anos; talvez menos. Mas, lembro perfeitamente do largo do Cambuci — onde funcionou o primeiro supermercado que conheci, o Peg Pag — todo enfeitado com cartazes e faixas e o chão coberto de cédulas em nome do doutor Adhemar. Foi grande a movimentação que antecedeu o comício. Senhores de terno e gravata — muitos com chapéus Ramenzzoni, onde meu avô trabalhava — desciam rapidamente dos bondes e lotações para buscar um lugar o mais próximo possível do palanque. Ao que me lembro, eram eleições para prefeito de São Paulo e um dos adversários do doutor Adhemar era o professor Jânio Quadros, que diziam morar num sobradinho da rua Sinimbú, ali nas imediações da rua Lavapés.

03. Para meu pai, não havia essa de morar perto ou longe. Era adhemarista convicto. De brigar com amigos e familiares, se preciso. Acreditava piamente no lema do doutor Adhemar: fé em Deus e pé na tábua. Ainda agora, mesmo anos e anos da morte do líder populista, recordo com saudade a definição do pai para os males do País, cada vez mais gritantes: o Brasil precisa de um gerente.

04. Acho oportuno registrar que minhas ligações com o adhemarismo terminam aí. Só repriso a história, agora no computador, porque ando com uma saudade danada do meu velho pai, que faleceu num ensolarado 1º de setembro, e para melhor flagrar a disputa eleitoral de outubro. Há expressivos contrastes e semelhanças. Hoje, os comícios não são mais os mesmos — o que pega pra valer é saber se o candidato é bom ou ruim de TV. Há quem diga que, se a TV tivesse a influência que hoje tem, o caudilho Getúlio Vargas, com pouco mais de um metro e meio de altura, jamais seria eleito presidente da República. Outro contraste: a plataforma eleitoral dos candidatos, com pontos absolutamente comuns. Muitas vezes não dá para se distinguir quem é situação, quem é oposição. Claro que falta autenticidade a muitas dessas propostas e o que conta — outra aberração dos nossos dias — é o amplo domínio dos marqueteiros sobre o político e o partido, ávidos por vencer o pleito.

05. De qualquer forma, está bastante clara a profunda decepção dos brasileiros com a classe política e governante. Esse desalento tende a generalizar todos os nomes, todos os partidos. É comum ouvir desabafos do tipo ninguém vai resolver nada, não vou votar em ninguéme daí pra baixo.

06. Mesmo reconhecendo que há razões de sobra para tanto amargor, acho oportuno lembrar que a participação de todos é fundamental para a reconstrução do País. Acho mesmo que as pessoas têm mais é que reclamar, que reivindicar. Devemos recuperar o direito pleno de intervir nos destinos do País.

07. Por isso, mesmo que seja difícil pedir a essa gente desvalida paciência e fé nos dias que estão por vir, é nosso dever estar integrado ao momento e participar com o voto com consciente. Pensarmos grande, numa sociedade mais digna e humanitária. Desperdiçar essa chance é condenar ao limbo a democracia que conquistamos às duras penas. E que, para se consolidar, precisa mais do que nunca ter a justiça social como pedra de arrimo e sustentação.

08. Lembre-se, caro leitor, votar é mais do que acreditar num slogan.