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O professor

"O jornalista não deve temer chegar ao fundo do poço na busca dos fatos, da verdade. É preciso encarar de frente todos os sacrifícios que esta verdade impõe. Não é nada fácil. Mas, se não for assim, é melhor procurar outra profissão…"

01. A voz convicta do professor de jornalismo não deixa transparecer qualquer rancor. Fala naturalmente ao exigir mais seriedade. Um grupo de alunos ameaçou reclamar. Todos estão convocados a trocar um provável final de semana ensolarado pela presença obrigatória no campus da Universidade de São Paulo para elaboração de um jornal-laboratório sobre o sitema de transporte da cidade universitária. Não há formalismos, nem pose de dono-da-verdade. Apenas deixa bem nítido que ele não está ali para fazer de conta: se não for assim, é melhor procurar outra profissão…

02. Semanas depois, numa noite de domingo — 25 de outubro de 1975 –, assisto ao espetáculo Brasileiro Profissão Esperança. Em cena dá para se perceber os ator Paulo Gracindo e a cantora Clara Nunes visivelmente emocionados. Nota-se um clima de profunda tristeza e indignação. Fim da sessão, os aplausos são interrompidos pelo choro de Clara e a notícia que, num ato de coragem, Gracindo faz questão de passar à platéia: o jornalista e professor Wladimir Herzog morreu tragicamente nas dependências do DOI-CODI de São Paulo.

03. Silêncio. Tristeza e indignação. E a história deste País começou a mudar. É preciso encarar de frente todos os sacrifícios. As recomendações do professor soaram sempre como um alerta para a profissão e para a vida. Lastima-se apenas que, 25 anos depois de sua morte, reverenciada nesta semana pelo Sindicato dos Jornalistas, a principal lição — o respeito aos humildes e à verdade — tenha desaparecido das preocupações de muitos de nossos mandatários que, àquela época, por sinal também se perfilavam pela redemocratização do País.

04. A lembrança do mestre sempre será relevante. Sua indignação diante das injustiças, mais do que oportuna nesta ante-véspera de eleições municipais. E sobretudo quando os poderosos brincam de aumentar os próprios e altos salários e ficam mendigando 180 reais para o mínimo.

05. Não apenas para que tenhamos consciência do nosso voto — um direito inerente a todo cidadão, mas que nos foi surrupiado nos anos do arbítrio –, mas a lembrança vale principalmente para que permaneçamos em estado de alerta contra todos aqueles que se imaginam senhores da Pátria e governam olhando o próprio umbigo…