HOME BLOG CONTATO INDIQUE ESTE SITE
 
Área:
BLOG | ver comentários |
Título: Sonhadores
Autor: Rodolfo C. Martino - publicado em 12/11/2006
 

Amiga, Leila, permita-me...

Vou usar como mote o seu aniversário (11 de novembro, que mais uma vez esqueci, falha imperdoável)) para entrar de alma e corpo - e a inversão aqui é justificada - no túnel do tempo e parar lá nos idos e findos anos 70. Trabalhávamos juntos na então combativa redação de Gazeta do Ipiranga. E como trabalhávamos!

Éramos jovens, quer dizer você e a Regina, bem mais do que eu. E ainda havia: o fotógrafo Clamic e o ‘big brother’ José Nascimento que, de soslaio e ancorado num perfumado cachimbo, a tudo via e discretamente nos orientava pelo caminho das pedras e das notícias.

Vez ou outra a sala sóbria e espaçosa do velho sobradão da rua Bom Pastor recebia as trepidantes visitas do socialista Zé Jofre (‘patrão bom nasce morto’) e do brincante Ismael Fernandes, colunista de TV e cinema. Outros também pererecavam por ali – o vereador Almir Guimarães, o Toporcov, o Natal Saliba, o saudoso Prof. Mendes --, mas o pessoal aí de cima era o que tinha voz e vez em cena aberta.

II.

Queríamos um Brasil livre, soberano e democrático. Modestamente, mas com tanta gana, tantos sonhos. Com dignidade, independência e textos, textos, textos. Como escrevíamos! Esquentávamos o radiador das velhas Olivettis. Toc, toc, toc. Totoc, toc... Laudas e mais laudas. As fotos em preto e branco para ilustrar. O Clamic e a velha Laica caixote nada perdiam. Dos buracos na periferia à Praça da Sé, turbinada por um milhão de vozes pelas diretas já. Sabe quanto tempo faz? Lá se vão 22 anos.

Mas, não é do passado que quero falar neste espaço. Até porque quase todo esse pessoal habita o Planeta chamado Saudades, e sempre que posso o reverencio em orações, escritos e citações em sala de aula.

Hoje, porém, sugiro distância da nostalgia ou qualquer forma de tristeza, mesmo que suave. Primeiro, porque estou feliz com as notícias que recebo de você, ainda que virtual, e mais ainda pelas histórias tidas, vividas e a viver que agora você me conta.

III.

Quer dizer que a moça agora, além de repórter - das melhores que conheço - virou escritora, especializada em artes plásticas. E que os filhos Edu e Juli andam a passos largos e firmes. O Edu é designer e músico, que bonito! E a Juli formou-se em jornalismo (hum!), trabalha e agora vai fazer mestrado na USP em Comunicação Social. Imagino a sua alegria e faço dela razão do meu sorriso neste domingão ensolarado.

Ai, ai, ai. Que trem melhor de bão, sô – diria o cearense Zé Jofre, com jeito matuto de quem encerrou seus dias às margens do rio Bonito, no Mato Grosso.

IV.

Você diz que isso não é o essencial. Em mensagens mais recentes, usa a lente dos dias idos para ver o futuro. Trabalhar, sim. Escrever, sempre. Deixar a impressão digital sobre o mundo, claro. Mas, no fundo, seria sempre o que diz hoje ser e querer: uma mulher como tantas que só pretendem envelhecer ao lado dos filhos e ver os netos – ainda por vir – a brincar felizes num tanquinho de areia.

Eis a Leila, cronista dos dias iguais e belos, que sempre admirei e admiro nos textos e na vida. Sempre a fazer poesia e a enxergar o belo de um jeito belo que deixa o belo mais belo ainda...

V.

Deixe estar, amiga. O Clamic era avoado, mas um bom fotógrafo. Uma vez numa discussão com o sabetudo Nascimento sacou essa: viver é igual a beber num balcão de mármore da padaria da esquina. Todos estranharam a comparação. Ele continuou. Se for para refrescar, a breja gelada, que seja a talagadas. Se for para aquecer, tempo de inverno, a cachaça, o conhaque ou mesmo o vinho tosco deve ser sorvido aos goles. Esquenta alma, coração e ainda você tem chance de ver se o tempo melhora lá fora. Ninguém entendeu, mas todos concordaram mesmo assim...

Éramos um bando de sonhadores. Ingênuos, talvez. Quem sabe, tolos? Mas, sonhadores sempre. E sonhos, moça, como diz a canção... Sonhos não envelhecem...

Parabéns!

 
 
COMENTÁRIOS | cadastrar comentário |
 
Autor: leila kiyomura moreno Data: 15/11/2006
Diante de tantas lembranças e, mais do que tudo, diante de tantos sonhos, temos o compromisso de ser feliz. E amar... Não a felicidade que de tão plena nos deixa infelizes para o resto da vida. Não o amor infinito de Dante que nos faz contemplar o inatingível.

Mas o amor e a felicidade que faziam Vinicius de Moraes brindar a vida num balcão de mármore (como dizia nosso amigo Clamic que enlouqueceu os astrônomos do mundo inteiro quando fotografou um disco voador). O amor e a felicidade das coisas simples do cotidiano que inspiram a alma de poetas feito você. Ser feliz e amar é um exercício diário, uma conquista da alma.

Sei que amizade não se agradece, se retribui com afeto. Deixo então uma carícia nos cabelos que presenciei o encanto de ficarem brancos. Um encanto que só é dado aos que se acompanham na mesma estrada. E se o gesto não substituir a palavra, quero que você saiba da minha gratidão.

Se não fosse você, eu não saberia juntar a fileira de palavras que andei espalhando pelas laudas afora. Foi você quem me ensinou a fazer um lead. Não um lead qualquer, mas a puxar o fio que vai desatando vida e sonhos. Se não fosse você, não teria conseguido equacionar o jornalismo à maternidade.

Você presenciou os dois momentos mais importantes da minha vida: a gestação da Juli e do Edu...

Enfim, sonhos que fluíram nos nossos filhos também jornalistas. Não que somos bons exemplos... Erramos e não foi pouco. Com certeza, poderíamos ter feito muito mais. Por nós e por quem amamos. Mas estamos aqui bravamente e prazerosamente saudando o sol. Há aqueles que morrem pelos sonhos. Agora nós, vivemos e sobrevivemos de tanto sonhar.

Obrigada pelo espaço no blog e na vida
 
 
© 2003 .. 2024 - Rodolfo Martino - Todos os direitos reservados - Desenvolvido por Sicca Soluções.
Auto-biografia
 
 
 
BUSCA PELO SITE