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Dom Quixote e a engenhoca

Tablet na mão, Sancho Pança consulta o Facebook quando trava diante do que vê.

Surpreso, não pensa duas vezes em se aproximar do amo e senhor, Dom Quixote.

A notícia que traz interessa – e muito – ao cavaleiro errante.

– Senhor, uma de suas mui amadas Dulcinéias vai casar ainda hoje.

Vamos esclarecer que este é um Dom Quixote pós-moderno. Um tanto instável nos humores e nos amores. Nunca se apegou às ameaças dos moinhos de ventos, menos ainda a uma única e indivisível Dulcinéia.

É um polivalente, digamos.

Está na estrada em busca do sonho.

II.

Mesmo assim, o nosso destemido sente o baque.

Ah, o amor…

Toma a engenhoca das mãos do subalterno, olha a foto da moça ao lado do eleito – e fica assim, digamos, um tanto comovido (“poderia ser eu”), outro tanto aliviado (“poderia ser eu”).

III.

– Procedi mal em avisá-lo, senhor?

A pergunta do fiel escudeiro quase se perde no silêncio do vale.

Sancho insiste, quase a se desculpar:

– Também fui pego de surpresa.

– Não se recrimine, amigo. Leve o Rocinante para beber água, lustre minha armadura e, por favor, me deixe por instantes a sós. Antes, porém , passe-me o smartphone que está no alforje.

IV.

Sozinho, enfrenta a aridez daquele descampado sem fim.

Assombra-lhe o peito uma dúvida atroz:

– Será que consigo conectar o meu whatsapp?

V.

Sem saber o que lhe espera a partir daquele instante, tecla ao ritmo compassado do baticum do seu coração:

“Felicidades!”

*amanhã continua…

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