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O ator

Lembram da história do livro que escrevi na engenhoca secreta do notebook – o mesmo onde pousou recentemente uma borboleta amarela – e posteriormente eu perdi a senha e o texto final…

(*Qualquer dúvida, a história desta história está na crônica Tesouro Perdido, no post de 26 de novembro. Já as aventuras da borboleta amarela aparecem nos dias 3, 4 e 6 de março.)

Lembram que eu prometi reescrever o livro – para o bem ou por culpa dos meus cinco leitores que tanto insistiram e outro tanto já esqueceram…

Lembram que num post do início deste ano — que não consigo encontrar agora –, eu prometi que cumpriria minhas promessas com meus cinco queridos leitores, que ontem se multiplicaram em 103 acessos…

Lembram de uma das promessas? Publicar aqui o livro…

Lembram de tudo isso… Lembram?

Pois chegou o dia…

Aí vai o primeiro capítulo…

Tomara que gostem.
E mandem sugestões e comentários…

Da minha parte, continuarei empenhado na busca para encontrar a seqüência da história…

Boa leitura!

I.

O ATOR

Ela não veio. E não virá.

Sei bem que é assim e assim implacavelmente será…

Pior para mim, catatônico Don Juan das quebradas desse mundaréu. Fim de linha. Estilhaços de bobeiras que arranham e machucam alma e coração.

Aliás, quer saber… Sempre soube que não viria mesmo quando ela tentava firmemente me convencer de que estava enganado.

Havia qualquer coisa em seu olhar, em sua proximidade que nos fazia iguais, cúmplices, comum de dois. Enrolados nas tais ondas eletromagnéticas dos sentimentos que não se explicam.

Mas perturbam, ofuscam, dominam…

Tentei chamar pela razão. Bobagem. Queria mais. Achei que poderia. Que merecia. Velas ao vento. Soltei as amarras e deixei me levar mar afora. Ondas, vagas, vagalhões. Furacões e tornados. Rumo ao desconhecido (que todos conhecemos tão bem).

Sonho ou fantasia.

Naufrágio à vista. Exagerei. A paixão, puro afã. Valeu o nada, o vazio. Pouco importa. Navegar é preciso. Viver também – e principalmente. Meio-amor, meio sentimento não existem…

Metade de uma grande paixão não é nem metade, nem grande, muito menos paixão.

Mesmo agora, quando sei o que sei, olho para o portão de acesso ao prédio, o estacionamento, os jardins, o saguão. Olho para todos os lugares. Procuro e procuro algum vestígio, a miragem ilusão de vê-la chegando como tantas vezes chegou sem que eu a esperasse.

É como rezar por um milagre. Só que anjos e santos, querubins e serafins têm mais o que fazer do que dar ouvido às minhas veleidades de pretenso Casanova que sequer gondolou pelos canais e becos de Veneza.

Não sei explicar.
Não sem fugir do óbvio das emoções primárias.

Parece que, por todo o corpo, corre em vasos e artérias um sangue envenenado que arde e queima e pressiona. Faz o coração bater acelerado, como dizem mesmo… ‘saltando pela boca’.

Como disse, não sei explicar — e há quem consiga? Mas queria muito entender o sim e o não desses romances tortos, como o anjo de Drummond. Ameaçam, insinuam. Mas, não se completam.

Talvez ela não tivesse nada melhor para fazer naquelas breves noites. O que se falou, o que se propôs, o que se fez e o que se deixou de fazer. Jogo de sedução. Toques sutis. Um jeito de corpo para acomodar o desejo que ameaçava transbordar. Queríamos demais ser felizes – só que cada um a seu modo, em seu mundo. Quem sabe seja por aí…

Representamos o tudo, o tudo que gostaríamos de ser e ter – e não somos e não temos mais.

Auto-engano, duplo.

Depois o reencontro sempre adiado.
Ou seria o verdadeiro encontro?

As desculpas, ao telefone.

“Não quero mudar minha decisão.
Você sabe embarco para Londres na outra sexta”.

O recado no email, dias depois.

“Quero lhe ver…
Se tiver coragem, apareço aí amanhã”.

Ela sempre soube que não viria. Mesmo assim acreditou na possibilidade. Ai, ai, ai. Fez questão de insinuar que sim.

Da intensidade do não, eu bem sabia.

Era como zerar nossas vidas.
Insistimos em nos enganar.

Mas, reconheço: fui eu o boneco joão-teimoso da trama. Imaginei: tinha tudo para dar certo. Motivos, aliás, não faltavam.

Enganei-me desde o primeiro momento.

Assimilei como absoluta a tal história que ela contou sobre a outra metade da laranja. Acreditei em alma gêmea, ponto luminoso, reencontro cósmico e outros ledos enganos.

Também pudera.

Se eu a tivesse projetado, poderia usar todos os requintes das novas tecnologias, juntar ingredientes das sete maravilhas, girar ao redor do Planeta em nome da ciência e, estou certo, não sairia tão perfeita, tão linda. O contato foi imediato. Tudo levava crer que sim. Luz e mistério.

De que tela de cinema, ela saiu?

Puxo pela memória. Busco o insondável. Olho para o céu. Corta os ares um jato que logo imagino ser da British Air Line. Naquele quase imperceptível ponto do infinito pode estar ela, a que não veio. Não virá.

Alguém a espera em Londres – ou em qualquer canto deste mundão de meu Deus? É provável.

Só agora me dou conta que também andei nas nuvens.

Como aqueles bimotores antigos, aliás.

Dei piruetas e rasantes, desenhei corações de fumaça e mergulhei em arriscados loopings. Tudo para encantar olhos que, a bem da verdade, já não me viam. Um baita equívoco.

Qualquer coisa como ir ao Iraque lutar por algo que, sempre soube, nunca seria meu…

Ironia das ironias.

Não sei porque agora me veio a fala de uma personagem de Millor Fernandes que representei tantas vezes, há tantos e tantos anos:

“Melhor cair das nuvens…
… do que se estatelar do quarto andar”.

Faz sentido.

* CENAS DO PRÓXIMO – EMOCIONANTE – CAPÍTULO: sei lá quando, mas, por favor, aguardem…