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A voz do dono

A Miriam deixou comentário no post “Primeiras Lições” que escrevi dia 9:

“Quem dera se o jornalismo fosse isso mesmo, né?”

Noto um tom de desalento e tristeza na breve linha.

Eu o li ontem à noite. Assim que cheguei em casa, vindo da colação de grau das turmas de 2009.

Conheço a Miriam.

Foi minha aluna no curso de jornalismo da Metodista – é um desses talentos raros para a profissão.

Talvez o contraste entre a alegria dos meninos que ontem recebiam o canudo de jornalistas e o desabafo da jovem repórter – deve ter quatro ou cinco anos de carreira, se tanto – me fez perder o sono.

II.

Que a profissão não é mais a mesma, sei bem.

Perdeu o tom de aventura e liberdade (ainda que algo enganosa) que tínhamos até, digamos, os anos 80 – e olhe que exagero na data.

Para definir essa mudança, costumo citar aos meus alunos uma figura de linguagem que Chico Buarque consagrou em uma de suas mais sábias canções:

“Vale mais a voz do dono
Do que o dono da voz.”

Chico se refere á relação dele com as gravadoras, também nos anos 80. Eu aplico o verso ao dia-a-dia do jornalista com os proprietários dos grandes conglomerados de comunicação em que os mesmos trabalham e ralam pra caramba.

Confesso que, na maioria das vezes, essa convivência é arrasadora.

Destrói carreiras e qualquer ilusão que se tenha sobre a tal função social do jornalista, como historiador do cotidiano e agente da mudança.

III.

Mas, vou lhes fazer outra confissão.

Lá nos idos tempos também a realidade não era muito diferente.

Tínhamos lá nossas pendengas com o editor, com a censura, com a linha editorial, com o comercial. Não era fácil. Havia dias que queríamos largar tudo para criar galinha, vender água de coco na praia, montar um boteco ou abrir uma pousada em alguma praia perdida nos confins deste Brasil.

Diria até que este era o assunto preferido dos nossos encontros diários naquele boteco na esquina entre as ruas Bom Pastor e Greenfeld, onde o Sacomã torce o rabo e que hoje deu lugar à uma moderna Estação de Metrô.

Por vezes, saíamos de lá trôpegos, mas decididos. A ponto de nos despedirmos dos amigos com um “até qualquer dia”.

IV.

Bobagem…

No dia seguinte, estávamos todos ali para recomeçar a labuta diária atrás de uma boa notícia que virasse manchete na edição seguinte.

Recomeçar sempre e sempre. Eis a nossa sina, Miriam…