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Sarriá *

(ITÁLIA IMPLACÁVEL: 3X2.
BRASIL FORA DO MUNDIAL DA ESPANHA)

Sabe-se, a luz do bom, senso, que a Copa do Mundo nada mais é do que uma competição esportiva. Talvez a mais emocionante do Planeta. Para os apaixonados torcedores brasileiros,certamente é a mais importante. Razão de vida. Afinal, vivemos ou não no País do Futebol?

Pois bem. Há algumas semanas, quando ainda era crescente a expectativa pelo Mundial,escrevi aqui, nesse espaço, que a vida, apesar de todo nosso arrebatamento, não se resumia a uma Copa do Mundo. E creio mesmo, não apenas por estarmos alijados de mais esse título – que desilusão! -, de mais essa alegria, que há conquistas bem mais reais à espera de toda fé, de toda participação, de todo patriotismo demonstrados nas últimas semanas.

Compreendo!

Essa colocação logo após o fracasso nas “calientes” e acolhedoras plagas espanholas pouco ou quase nada adianta, tal o desconsolo de nossa gente. Pode-se perder em tudo. O brasileiro faz até piada da inflação, do custo de vida. Chega mesmo a ironizar as estultices de seus homens públicos. E nem se incomoda caso lhe inventem um novo – e absurdo – imposto a pagar. Pode-se perder em tudo – repito, menos no futebol, mescla de arte, paixão e vida de um povo.

Não sei se a afirmação de algumas semanas teve algo de premonição ou coisa do tipo. Confesso desde já que não sou afeito a adivinhações. Sei, porém, que, embora cintilasse a confiança no brilho dos comandos de Telê Santana – o bom-mineiro – sempre achei conveniente ficar de sobreaviso. Não foi pessimismo, não. Uma questão de prudência.

Hoje, já com alguma frieza, concluo que foi exatamente esse imprescindível ingrediente que faltou à Seleção, mais especificamente diante da Itália – um adversário forte, com jogadores experientes e, reconheça-se, de talento indiscutível.

Com efeito, o próprio Zezé Moreira, veterano conhecedor de futebol que acompanhou, como “olheiro” da CBF, a chave da Itália na primeira etapa do Mundial, observou a Telê: merece respeito um time composto por jogadores como Zoff, Gentile, Chirea, Cabrini, Tardelli, Antonioni, Bruno Conti e esse oportunista Paulo Rossi.

Apesar do alerta, todos os brasileiros só falavam em goleada. Mesmo quando estávamos em desvantagem no marcador, ninguém se abalou. Os deuses da bola logo, logo despertariam para o massacre à atrevida Azzurra. E assim foi até o surpreendente terceiro gol que, na verdade, dizimou todas as esperanças nativas. Por essa, há quem acrescente, nem os italianos esperavam.

Concordo que não é tempo de se promover uma desnecessária caça às bruxas, acusar esse ou aquele, procurar culpados. Afinal, pelo que se viu, todos perdemos a chance de ser tetra. Particularmente, no entanto, gostaria de fazer uma breve – mas, indispensável – ressalva. Esse pessoal que nos representou no Mundial 82 é, sem dúvida, o que há de melhor. Talvez pudéssemos trocar dois ou três nomes – nada mais. E fez o que pôde, o que estava ao alcance de cada um. Só que eles não são tão perfeitos como decantou nossa imprensa. Têm falhas – e graves.

Na verdade, desde o Mundial de 70, nossos jogadores não chegam a se completar como craques, campeões, e por uma série de razões. A principal delas é o endeusamento precoce que dirigentes, torcedores e sobretudo a imprensa esportiva logo promovem quando surge alguém acima da média.

Não raras vezes, bastam um ou dois jogos para ser citado como novo Pelé,
ganhar manchetes e páginas inteiras sobre sua vida e seu futuro. Daí logo se descobre que ele pode gravar um disco, virar garoto propaganda, ser pastor de uma nova religião etc.

Claro que com tantos interesses em jogo, com tantos milhões rolando, em meio a tanto oba-oba, fica difícil que o indivíduo, de repente, entenda-se como um simples atleta. Que ele depende de seus músculos e de seu empenho para vencer – e que a vitória nunca está garantida antes dos 90 minutos.

Segunda-feira, de triste memória, a Pátria descalçou as chuteiras. E por momentos, vestiu-se de luto.

*Crônica que escrevi em 5 de Julho de 1.982 sobre a Tragédia de Sarriá, publicada no livro “Às Margens Plácidas do Ipiranga”.